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Capítulos Iniciais

O Poder Esmagador do Cinema

APRESENTAÇÃO

Para a geração dos baby boomers como eu, ir ao cinema significava participar de um ritual coletivo semanal (até diário para muitos), obrigatório e sensacional. Mas descrever como ocorria esse culto para as novas gerações que nasceram na passagem do segundo para o terceiro milênio pode empanar muito o seu encanto quando lembramos que as salas de exibição funcionavam de um jeito completamente diferente das de hoje. Por exemplo, não havia nenhum sistema de reserva ou escolha prévia de lugares e os frequentadores podiam entrar livremente no meio ou até no final das projeções, o que era uma estratégia comum para garantir um bom lugar na sessão seguinte. Na semana dos lançamentos dos grandes filmes, as filas eram quilométricas e o público completamente conformado com a perspectiva de duas horas de espera ao relento até a retomada da venda dos ingressos para as sessões sucessivas. 
    E o que acontecia após a abertura das portas de acesso aos diferentes setores de plateia antes do início de uma nova sessão só poderia ser comparado com o estouro de uma boiada. Entretanto, nenhuma dessas circunstâncias, hoje certamente consideradas grotescas e inaceitáveis pelo público dos minúsculos cinemas de shopping, diminuía em um milímetro a sensação de expectativa que reinava entre nós, cada vez mais exaltados a cada toque do gongo que sinalizava o início solene da sessão, seguido do arrasto das pesadas cortinas de veludo para as laterais, enquanto emergia uma tela simplesmente gigantesca para o qual entregávamos nossa mente e nosso coração subjugados.
    Nesta era pós-pandêmica (ou “pré”, dependendo de qual pandemia nos referimos), a proliferação de notícias como a de que a Regal Cinemas, segunda maior rede de exibição do mundo com 500 salas espalhadas nos Estados Unidos, está à beira da falência, ou a de que no Brasil uma recuperação completa do público de salas de cinema nos níveis de 2019 é esperada apenas em 2024, parece indicar que a experiência cinematográfica na tela grande talvez esteja fadada à extinção. Nomes com a estatura de um Martin Scorsese, Francis Ford Coppola ou Steven Spielberg ainda tentam sensibilizar os amantes do cinema para não desertarem as salas, não só porque nelas as projeções proporcionam uma experiência audiovisual muito mais profunda e espetacular do que a do consumo caseiro, mas também porque cada sessão de cinema nos coloca no centro de uma atmosfera, diríamos, quase tribal, quando nossas reações se fundem com as das pessoas que nos cercam e todos parecem tomados pelas mesmas ondas magnéticas. Mas hoje suas vozes ecoam ignoradas num oceano de telinhas, invasoras e atrevidas em todos os lugares e instantes de nossas vidas, embora minúsculas e mesquinhas. Mas não a de Christopher Nolan.
    Um dos mais bem-sucedidos diretores cinematográficos da atualidade, tanto artística como comercialmente, Nolan jamais se acomodou sobre os louros de uma das filmografias mais celebradas e influentes da história do audiovisual, em que se incluem vários “clássicos contemporâneos” como Amnésia (2000), Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008), A origem (2010), Interestelar (2014) ou Dunkirk (2017), cujos enredos, requintes técnicos e apelo visual almejaram não apenas um consumo casual e voraz que uma vez saciado é futilmente descartado. Seu escopo sempre foi ir muito além. Inspirado pelos grandes arquitetos da imagem - Orson Welles, Stanley Kubrick e David Lean, estes dois últimos, os corifeus da grande tela – Nolan abraçou a tecnologia de captação e projeção IMAX como sua ferramenta preferencial a fim de restaurar em grande escala e exclusivamente nas salas de cinema, o esplendor e o maravilhamento que tornaram o Cinema a arte e o entretenimento supremos do século XX. Essa batalha quase solitária tem lhe trazido tremendos desafios e sacrifícios pois seus oponentes são quase invencíveis: o apagamento na memória coletiva do cinema como experiência sensorial e transformadora total, e o consumo instantâneo e rasteiro das imagens gestadas pelas transformações tecnológicas digitais.
    E é a história dessa corajosa aposta de Christopher Nolan que o jovem pesquisador Pablo Savalla se propõe a contar para nós. Formado em Cinema pela Universidade Estácio de Sá, onde tive o privilégio de orientar a sua monografia de fim de curso contemplada com a nota máxima pela banca examinadora e embrião deste livro, Pablo preocupou-se em estruturar o seu trabalho de forma que pudéssemos compreender historicamente de onde brotaram as ambições que vêm nutrindo o ideal artístico de  Nolan. As páginas iniciais se ocupam em rastrear a perseguição obsessiva de artistas, cientistas, cineastas e técnicos pela “experiência imersiva total” proporcionada pelas imagens em movimento. Essa fascinante viagem na história do cinema de par com suas várias tecnologias nos conduzirá, então, a uma análise do potencial imagético e artístico dos produtos IMAX para, daí sim, encontrarmos Christopher Nolan na sua saga missionária: restituir às imagens do cinema seu poder primordial num espaço nobre em que possamos viver com plenitude seu mistério, encanto e inteligência.


Flávio Di Cola
Mestre em Comunicação e Cultura pela UFRJ Publicitário, jornalista e roteirista, Ex-professor e ex-coordenador dos cursos de Publicidade & Propaganda e de Cinema da Universidade Estácio de Sá).

NOTAS DO AUTOR

Durante a adolescência, tive um blog, que começou em 2011. Eu tinha apenas 16 anos e estava no ensino médio. Queria um espaço onde pudesse escrever minhas opiniões sobre livros, filmes e música. Sem pretensões. Só queria escrever mesmo. Na época, os blogs ainda eram uma alternativa popular, hoje não sei se alguém ainda tem blog. Em 2011 existiam Orkut e MySpace. O Facebook e o Instagram não eram tão nocivos. Os Smartphones estavam se popularizando. Restavam locadoras. “Streaming” não fazia parte do nosso vocabulário. Não existia TikTok. Outros tempos...
    Muitos anos depois, com o blog parado há muito tempo, resolvi reler o que tinha escrito durante aquele período e me deparei com um texto de 18 de julho de 2012 que não podia deixar de adicionar aqui. “Nossa... Sem palavras. Eu fiquei simplesmente perplexo desde o momento em que entrei na sala até o momento em que eu voltei para casa. Mas nada se compara ao trailer em IMAX do novo filme do Batman... Foram as primeiras imagens em IMAX que vi. Sensacional, imperdível, todos merecem ver um filme em IMAX.”
    A partir daquele dia, como você pôde perceber, minha admiração em relação ao tema deste pequeno livro começou. E o que mais me deixa incrédulo é que o meu fascínio ao sair de uma exibição em IMAX é o mesmo até hoje. Trata-se de uma experiência única de imersão.
    O que vocês irão ler nas próximas páginas é uma pesquisa de monografia, apresentada, em 2018, para o Curso de Cinema da Universidade Estácio de Sá (UNESA), recebendo grau 10. Sempre achei que este estudo pudesse ser mais do que um TCC. Anos depois de tê-lo apresentado, reli, reescrevi, atualizei e acrescentei mais material com o intuito de transformar aquele trabalho acadêmico no livro que apresento agora.
    Esta pesquisa tem como objetivo informar sobre o potencial imagético e imersivo do cinema, demonstrando os diferentes mecanismos usados por essa arte ao longo dos anos até chegar às mais recentes tecnologias de imersão, com enfoque à tecnologia IMAX. Aborda-se a temática à luz da filmografia de Christopher Nolan, ponderando a sua importância para o cinema tradicional imersivo.     Por meio de referências bibliográficas, filmes, sites, vídeos, blogs e opiniões de profissionais de áreas envolvidas com o cinema, observa-se como o uso da tecnologia IMAX permanece em um mundo cada vez mais digital, permitindo uma imersão profunda pelo tamanho imagético proporcionado pelo formato, sem uso de outros estímulos tecnológicos como o 3D e o 4D.
    Desde o começo, busquei escrever de uma forma acessível a todos os tipos de leitores. Espero que apreciem e que se fascinem pelo tema da mesma forma com que eu me fascinei escrevendo e pesquisando o material que aqui compartilho.
    Boa leitura!


Pablo Savalla

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